Dois tipos de greves

Foto por Carlos Latuff
Auto-organização, Educação

Dois tipos de greves

Se analisamos as recentes greves no setor da educação pelo Brasil nos três níveis do Estado – federal, estadual e municipal – do ponto de vista de seus objetivos declarados e dos resultados atingidos, percebemos a existência de pontos comuns nas formas de preparação e organização das greves que nos levam obrigatoriamente a questionar se a continuidade de tais pontos comuns realmente levam o proletariado a alcançar vitórias em relação ao que reivindicam ou se, pelo contrário, a forma adotada contribui sobretudo para as derrotas.

Não se trata de negar a influência de fatores conjunturais que sabidamente contribuem para que uma greve seja vitoriosa ou derrotada, mas o que nos interessa aqui é destacar certas características “estruturais” que obrigatoriamente devem ou não existir, serem defendidas ou combatidas – para que qualquer greve disponha da força necessária para atingir os objetivos aos quais se propôs.

Um primeiro aspecto se refere ao “antes” da greve.  Já na metodologia de preparação se pode identificar a tendência de uma greve para ser derrotada ou vitoriosa. Basta proceder a algumas verificações: ela começou com os próprios trabalhadores discutindo em seus locais de trabalho ou com a “visita” de sindicalistas  “convocando” os trabalhadores a paralisarem suas atividades? A pauta de reivindicações tem como pontos principais necessidades comuns a outros segmentos de trabalhadores e da população ou prioriza questões internas e específicas de categoria?

Em seguida, no “durante” o desenrolar da greve, algumas questões são decisivas para definir qual o tipo de greve se desenvolve. Existe comando de greve? e, se existe, é superior e independente ao do sindicato? as deliberações do comando contemplam tanto o nível local quanto o nível geral da greve ou apenas funcionam como filtros para restringir o que será debatido em assembleia geral?

Para resumir, como uma das formas de expressão dos conflitos sociais existentes no capitalismo, uma greve,  para não ser derrotada desde o seu começo, deve apresentar algumas características básicas: 1) se realizar por fora dos aparelhos sindicais; 2) pretender se generalizar para vários segmentos de trabalhadores, e caso consiga, deve ser acompanhada da ocupação dos locais de trabalho; 3) deve ser deliberada pela totalidade dos trabalhadores (efetivos e temporários, concursados e terceirizados) e por tempo indeterminado; 4) as reivindicações devem diminuir a desigualdade entre categorias (ex: aumentos salariais nominais e não percentuais) e deve atingir para além de questões financeiras (atingir a estrutura hierárquica da empresa, o sistema salarial como tal – em especial eliminar a concessão de bônus e prêmios -, a gestão da empresa, além de modificações relacionadas com a vida do trabalhador na empresa tais como ponto, atrasos e condições de trabalho); 5) o curso da greve deve seguir um processo específico (comitê de greve abrangendo sindicalizados e não sindicalizados, a assembleia geral se pronuncia sobre todas as questões relativas à greve, eleição e revogação a qualquer tempo tanto dos integrantes do comitê de greve quanto de quem negocia com o patronato. Atos públicos devem ser pensados como forma de atingir outros setores de trabalhadores e não como ações de marketing ou de autopromoção); 6) valorizar a espontaneidade de todo e qualquer grevista e a criação de momentos de estudo e formação teórica como atividade de greve.

Com tais características, as greves não apenas deixam de ser “presa fácil” para os capitalistas, como também se constituem em formas questionadoras do funcionamento da sociedade atual e fontes de aprendizado e exercício para o proletariado administrar a sociedade futura.